O Governo angolano estima arrecadar mais de 440 milhões de euros em 2019 com a introdução do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) em Angola, adiada entretanto para Julho, mas sem descartar um novo adiamento nos prazos.
A informação consta do relatório de fundamentação da proposta de Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2019, que estará em discussão e votação até 15 de Dezembro na Assembleia Nacional, com o Governo a apontar a introdução do IVA — inicialmente prevista para 1 Janeiro próximo — como uma das estratégias de consolidação fiscal.
“Um segundo adiamento no calendário da implementação do IVA, ainda que para o II semestre de 2019, implicará menor arrecadação de receitas do que as previstas no orçamento, implicando um agravamento das necessidades de financiamento”, lê-se no relatório de fundamentação do OGE.
O documento acrescenta que o executivo “elaborou já um plano de contingência para relaxar potenciais riscos já identificados com a implementação do IVA nos termos programados”.
“A Lei do OGE trará medidas de contingência para salvaguardar eventuais atrasos na implementação do IVA”, sublinha.
Um outro documento da proposta de OGE para 2019, sobre as receitas orçamentadas para o próximo ano, refere a previsão de arrecadação de 156.230 milhões de kwanzas (441,2 milhões de euros) de receita fiscal através do IVA. Este imposto deverá progressivamente substituir o actual Imposto sobre o Consumo.
Em 2019, o Governo projecta ainda arrecadar 118.158 milhões de kwanzas (333,6 milhões de euros) através do Imposto sobre o Consumo de bens, e 35.271 milhões de kwanzas (99,5 milhões de euros) com o Imposto sobre o Consumo de Serviços.
Na proposta de OGE para 2019, o Governo prevê arrecadar receitas fiscais — impostos, contribuições sociais e outras — mais de 7,423 biliões de kwanzas (21.100 milhões de euros).
Este Orçamento contempla despesas e receitas no montante de 11,345 biliões de kwanzas (32.340 milhões de euros), um aumento absoluto de 17,1% relativamente ao OGE de 2018.
Prevê um crescimento económico em 2019 de 2,8% do Produto Interno Bruto (PIB) e uma inflação acumulada (Janeiro a Dezembro) de 15%.
As contas da Administração Geral Tributária
A colecta do IVA vai representar 4,2% do valor do PIB, segundo as projecções da Administração Geral Tributária (AGT), tendo o o seu director, Leandro Cruz, dito em Agosto que a introdução do IVA vai mais do que triplicar o Imposto de Consumo, que desaparecerá, uma vez que atinge actualmente 1,3% do PIB.
Leandro Cruz lembrou estar em curso um estudo de arrecadação de receitas e de impacto económico nas famílias e nas empresas para “aferir o que o país vai ganhar com o novo imposto”.
O Imposto de Consumo, sublinhou, resumia-se a uma classe restrita de contribuintes que realizavam pagamentos de importação, produção e alguns serviços de segurança e consultoria contabilística.
“Ao contrário, o novo sistema de impostos vai permitir alargar a base tributária a todos os serviços, reduzindo o comércio informal”, explicou.
Leandro Cruz recordou que Angola é o único país da África Austral que ainda não introduziu o IVA no sistema de pagamento de impostos.
“Angola aderiu agora à Zona de Comércio Livre da SADC (Comunidade de Desenvolvimento da África Austral), onde os produtos são comercializados livres de impostos e, se o nosso país não introduz o IVA, perde receitas, tornando-se menos competitivo que os que utilizam o imposto”, afirmou.
A implementação do IVA resulta de um conjunto de acções de curto prazo, atribuídas ao Ministério das Finanças, resultantes do alinhamento com o Plano de Desenvolvimento Nacional 2018/2022, enquanto instrumento orientador da gestão económica e social do país.
Tudo está a ser acelerado no quadro do Plano Intercalar do Executivo, aprovado em 2017, que prevê a implementação das acções necessárias para a inclusão do IVA no Orçamento Geral do Estado de 2019, definida nas visitas do Fundo Monetário Internacional (FMI) a Angola, em Setembro de 2016 e Dezembro de 2017.
Actualmente, o Imposto de Consumo permite a dupla tributação, conhecido por “efeito cascata”, uma realidade de muitos países que Angola pretende evitar.
“Inicialmente terá o regime geral para as empresas nesta categoria, onde se poderá liquidar o IVA nas facturas, deduzir nas aquisições, e solicitar o respectivo reembolso. Já o regime de não sujeição irá permitir que estes comerciantes não liquidem o IVA nas facturas”, alertou Adilson Sequeira, coordenador do Grupo Técnico para a Implementação do novo imposto em Angola.
“O que se pretende com a entrada em vigor em 2019 é manter o regime de não sujeição das empresas que estiverem abaixo do linear, e ter o regime geral como obrigatório para os contribuintes cadastrados na Repartição Fiscal dos Grandes Contribuintes, devendo para o efeito obedecer ao cumprimento do período transitório de dois anos, que vai até 2020”, explicou.
O IVA é um imposto geral que incide sobre o consumo de bens e serviços, em taxas variáveis e nas várias fases do circuito económico. Incide, por isso, sobre o consumo de produtos, serviços, importações e transacções comerciais. Na prática, a cobrança do IVA tem lugar quando uma empresa vende um produto ou serviço (emitindo a respectiva factura). Por sua vez, o consumidor paga o valor do bem ou serviço acrescido do IVA que será entregue ao Estado.
A informação consta da proposta do Código do IVA. No documento é referido que a taxa única de 14% ainda aguarda “pelos estudos de impacto na arrecadação” e que estão sujeitos ao IVA, na generalidade, as transmissões de bens e as prestações de serviços efectuadas no território nacional, bem com as importações.
Internamente, a proposta do Código do IVA prevê a isenção do pagamento nos produtos e bens da cesta básica – incluindo leite, arroz, feijão, sabão, farinhas, óleos e açúcar -, bem como nas prestações de serviços médicos e sanitários efectuadas por estabelecimentos hospitalares e clínicas, além de medicamentos, especialidades farmacêuticas e outros produtos destinados exclusivamente a fins terapêuticos, incluindo os de uso veterinário.
As transmissões de bens “a utilizar exclusivamente como matérias-primas, produtos intermédios e componentes para o fabrico de medicamentos”, bem como implantes para o organismo humano, também ficam isentos de IVA, o mesmo acontecendo às cadeiras de rodas, equipamentos de braille, livros, jornais e revistas.
Nas prestações de serviço, apenas ficam isentas as que tenham por objecto o ensino e a formação técnico-profissional.
Gasóleo, gasolina, gás e lubrificantes integram igualmente a lista das isenções do IVA.
Nas importações, a proposta do Governo prevê isentar de IVA os bens “que gozem de isenção ou suspensão de direitos de importação”, ao abrigo da Pauta Aduaneira, bem como matérias-primas e materiais subsidiários incorporados no processo de fabrico, bem como as peças sobressalentes, “desde que devidamente certificados pelo Ministério que superintende e da declaração de exclusividade”.
Em Fevereiro, o Ministério das Finanças criou um grupo de trabalho, juntando especialistas, empresários e advogados, para aconselhamento da tutela em domínios relacionados com a reforma da política tributária angolana.
O grupo de trabalho para as questões tributárias foi criado por despacho do ministro Archer Mangueira e tem a “incumbência de auscultar e aconselhar” o titular da pasta, nos domínios “da fiscalidade, direito fiscal, direito aduaneiro e matérias conexas”.
“Caberá ao grupo citado, no geral, pronunciar-se sobre a adequação ou conformidade das várias iniciativas de política tributária, tendo em conta a realidade social, económica e política do país, bem como pronunciar-se, em especial, sobre as iniciativas legislativas relativas ao processo da reforma estrutural do sistema tributário”, lê-se numa informação oficial.
Além do próprio ministro das Finanças, o grupo de trabalho para as questões tributárias integra o secretário de Estado das Finanças e Tesouro, o presidente do conselho de administração da Administração-Geral Tributária (AGT), além de directores do Ministério das Finanças e da AGT.
As ordens dos Advogados e dos Contabilistas e Peritos Contabilistas de Angola, a Confederação Empresarial de Angola, a Associação Industrial de Angola, a Câmara dos Despachantes Oficiais de Angola e a Associação das Seguradoras integram igualmente este grupo de trabalho, para aconselhamento do Ministro das Finanças.
Folha 8 com Lusa